Você deixaria um médico receitar sempre o mesmo remédio só porque “simpatiza com a empresa farmacêutica”? Ou aceitaria que um engenheiro use sempre o mesmo tipo de concreto, mesmo com materiais mais modernos e seguros no mercado, apenas porque gosta, conhece ou está acostumado com a empresa fornecedora? Parece absurdo. Mas muitos investidores fazem algo parecido todos os dias: seguem aplicando dinheiro apenas no que já gostam ou no que estão acostumados, como se afinidade fosse sinônimo de retorno.
“Invista no que você conhece” — o conselho, imortalizado por Peter Lynch, já foi valioso. Mas como todo bom conselho mal interpretado, virou justificativa para a comodidade. Ao invés de incentivar o estudo de um setor ou de um produto, muitos usam essa frase para jamais sair do lugar. Trocam o conhecer antes de investir por um “invisto porque conheço”, ainda que superficialmente.
É o viés da familiaridade em ação. O cérebro humano busca conforto, e o que já é conhecido parece mais seguro — mesmo que não seja. Isso explica por que tantos mantêm há anos aplicações ruins, só porque já estão ali, sem se perguntar se ainda fazem sentido. Ou pior: sem querer saber se há alternativas melhores.
O outro erro comum é investir no que se gosta. Não faltam investidores apaixonados por empresas de um setor específico ou por marcas que consomem. Mas gostar de uma empresa é uma coisa. Ela ser lucrativa e bem precificada é outra completamente diferente. Ninguém deveria investir com o coração.
Você não compraria um imóvel só porque gosta da fachada. E não deveria colocar dinheiro em uma empresa só porque gosta do produto. Simpatia não protege contra prejuízo.
Imagine um comandante que insiste em seguir para onde o sol está bonito, ignorando o combustível, o vento e o peso da aeronave. Pode ser agradável no início — até dar errado. Investir sem estratégia é como pilotar sem instrumentos.
Benjamin Graham, mentor de Warren Buffett, já dizia que “o maior inimigo do investidor é ele mesmo”. E, muitas vezes, esse inimigo se esconde atrás de frases simpáticas, mas mal interpretadas ou de escolhas impulsivas.
Investir bem exige uma dose saudável de desconforto. É preciso estudar o novo, avaliar o cenário, testar hipóteses e, se necessário, mudar de ideia. Aquilo que parece fácil e familiar nem sempre será o que vai gerar o melhor resultado. Estar desconfortável faz parte do processo de investimento.
A pergunta que fica é: você está construindo uma carteira de investimentos… ou apenas acumulando produtos com os quais se sente emocionalmente confortável?
Gostar é ótimo. Conhecer é essencial. Mas investir exige mais do que isso. Exige critério, racionalidade e uma disposição permanente para evoluir.
Se você quer retorno, precisa parar de procurar conforto. Porque retorno mora onde existe análise, estratégia e, muitas vezes, incômodo. Investir bem é mais sobre fazer o que é necessário do que fazer o que é familiar.
E, principalmente, lembre-se: o mercado não se importa com as suas preferências. Ele recompensa quem toma boas decisões — e pune quem insiste em paixões.
Portanto, da próxima vez que olhar para a sua carteira, pergunte-se com honestidade: estou investindo com inteligência… ou apenas me agarrando ao que gosto?
Lembre-se, você não deve investir no que gosta ou no que conhece, mas sim conhecer sobre seu investimento e gostar do que investiu.
Michael Viriato é assessor de investimentos e sócio fundador da Casa do Investidor.
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