Recentemente respeitados articulistas defenderam, neste mesmo privilegiado espaço, a tributação das exportações. A ideia desse artigo é oferecer aos leitores da coluna um contraponto —uma outra visão.
Apoiando-se na retórica surrada acerca da necessidade reindustrialização do país, os autores do texto defenderam a manutenção do veto presidencial sobre a regra aprovada pelo Congresso Nacional, no contexto da regulamentação da reforma tributária, que afastaria a cobrança do Imposto Seletivo (IS) sobre as exportações de minério de ferro, derivados do petróleo e carvão mineral.
Vale lembrar: os argumentos pela rejeição do veto são conhecidos, tendo sido exaustivamente debatidos nos últimos anos: nossa Constituição garante a imunidade das exportações, prestigiando a noção básica de que tributos não devem ser exportados, de modo a favorecer a competitividade dos produtos nacionais frente aos seus concorrentes estrangeiros. A tentativa de excepcionar o Imposto Seletivo violaria frontalmente tal princípio, que é observado por países de todo o mundo.
Para além da questão jurídica, o argumento econômico é ainda mais contundente, na medida em que petróleo e minério de ferro são dois dos principais itens que equilibram nossa balança comercial. Tributá-los significaria reduzir sua competitividade e desestimular o consumo do produto nacional, o que se revela especialmente temerário sob contexto geopolítico atual, no qual uma guerra comercial de grandes proporções parece iminente. Definitivamente, exigir novos tributos sobre alguns dos itens mais relevantes para a manutenção do superávit da nossa balança comercial não parece a resposta mais apropriada às ameaças de imposição de tarifas adicionais sobre produtos brasileiros que partem de um de nossos principais parceiros comerciais.
Surpreende, portanto, que os defensores da tributação das exportações tenham incorporado ao debate o argumento de que a oneração da venda de produtos primários para o exterior serviria para promoção da reindustrialização do Brasil. A lógica, desprovida de fundamento empírico e econômico, seria de que, ao reduzir as exportações, haveria incentivo às indústrias de transformação local e redução da dependência de produtos importados. É um raciocínio com perfume de bolor.
Um comentário inicial sobre a tese é inevitável: normalmente adotado pelos chamados desenvolvimentistas para justificar a imposição de barreiras comerciais sobre bens importados, o apelo à reindustrialização parece ter passado por uma reciclagem para ser empregado também como justificativa para a cobrança de tributos sobre a exportação de bens.
No caso específico do minério de ferro e do petróleo, sabe-se que o volume produzido excede sensivelmente a capacidade de consumo do mercado interno. A tributação da parcela da produção destinada ao exterior, o resultado esperado será o encarecimento e a perda de competitividade do produto brasileiro no mercado internacional, gerando estoques excedentes que o mercado doméstico não é capaz de absorver.
A ideia é fadada ao fracasso. Não faltam exemplos de políticas tributárias semelhantes, que não deram certo. Veja-se o caso da Argentina, que, em 2008, tentou taxar exportações com o discurso de baratear o preço no mercado local, e os resultados foram a queda do PIB argentino e aumento da pobreza, com desequilíbrio fiscal. Por quê, então, resgatar essa ideia para tributar exportações de ferro e o petróleo haveria de produzir resultado diferente?
Elevar a redução da competitividade do produto nacional ao status de política pública levará à redução da demanda por esses produtos, reduzindo também o incentivo para que os principais players invistam na ampliação da produção, com a consequente redução da oferta e aumento de preços. Em resumo, o resultado é exatamente o oposto daquele que os defensores da ideia dizem perseguir: desestímulo às indústrias de extração e perda de competitividade, de milhares de postos de trabalho e da arrecadação tributária local.
É fato suficientemente documentado na literatura econômica que a abertura para o comércio internacional produz riquezas para as nações e que escoar a produção doméstica para o mercado externo é essencial para as grandes economias globais. A adoção de um protecionismo às avessas, que equivaleria à imposição de tarifas sobre si mesmo, é uma ideia despropositada e que merece ser veementemente rechaçada.
Espera-se que o Congresso tenha essa sensibilidade e derrube o veto presidencial, sem dar espaço a essa lógica falha de estimular a industrialização nacional por meio da criação de obstáculos à competitividade dos produtos nacionais. O desenvolvimento da indústria brasileira é prioritário e deve ser perseguido por um conjunto de políticas públicas cuidadosamente desenhadas, mas certamente não virá por meio do desestímulo às exportações.
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