De fábricas de automóveis a fundições de alumínio, Donald Trump quer trazer a manufatura de volta aos EUA travando a maior guerra comercial desde a década de 1930, mas executivos alertam que a incerteza tarifária tornará arriscado demais investir bilhões de dólares na construção de novas plantas americanas.
“Reshoring” tem sido uma prioridade para o presidente dos EUA, com empresas como Apple, Diageo e Johnson & Johnson correndo para anunciar US$ 1,9 trilhão (R$ 11,4 trilhões) em investimentos nos EUA desde sua eleição, incluindo o fortalecimento de sua capacidade de manufatura.
Mas a busca por propriedades, o design e a construção de uma fábrica, juntamente com pedidos de licenças e encomendas de robôs e outros equipamentos de manufatura, significam que as fábricas levarão anos para serem concluídas e muitas provavelmente não estarão prontas antes do término do segundo mandato de Trump.
“Levará entre três e dez anos, na maioria dos casos, para construir uma nova instalação de manufatura nos EUA”, afirma Erin McLaughlin, economista do Conference Board com experiência em design e construção. “Tudo leva tempo antes que você possa ter aquela foto de um congressista com uma pá na mão”, acrescenta.
Empresas que buscam proteger suas cadeias de suprimentos podem optar por aquisições domésticas em vez de iniciar uma nova construção, disse ela. “Pode ser mais rápido comprar uma empresa do que construir uma nova fábrica”.
Dado o longo e custoso processo de construção de uma fábrica, muitos executivos estão cautelosos em investir imediatamente em novas instalações enquanto persiste a incerteza sobre se Trump manterá sua política comercial.
“A construção de uma fábrica levará anos e depois ela estará por aí por décadas, então você precisa ter uma visão de longo prazo de para onde os regimes irão”, afirma Mark Wakefield, líder global do mercado automotivo na AlixPartners. “Você não vai tomar uma decisão de longo prazo hoje porque vai querer deixar as coisas se acalmarem e ver um pouco mais como as coisas vão”.
O caos no mercado desencadeado pelos anúncios tarifários de Trump na semana passada gerou críticas de bilionários como o investidor Stanley Druckenmiller e Ken Langone, cofundador da Home Depot e doador de longa data do Partido Republicano, aumentando a pressão para suavizar algumas das tarifas.
Na terça-feira (8), o secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent, disse à CNBC: “[Os CEOs] não vão estalar os dedos, encontrar um local disponível e construir uma fábrica, mas tenho certeza de que o planejamento já começou nas salas de reuniões porque passei o fim de semana conversando com CEOs e banqueiros de investimento e é exatamente isso que está acontecendo.”
Bessent acrescentou que acreditava que os executivos ainda estavam “elaborando planos para quando terminarmos essas negociações [comerciais]”.
No caso dos automóveis, construir uma planta do zero leva pelo menos de dois a cinco anos, de acordo com executivos do setor. O tempo e o custo dependem do tamanho da planta, bem como se componentes-chave como powertrains e baterias serão produzidos no mesmo local.
A sul-coreana Hyundai investiu US$ 12,6 bilhões (R$ 76,3 bilhões) para construir uma fábrica de veículos elétricos e células de bateria na Geórgia, o que levou cerca de dois anos e meio desde a assinatura do acordo até o início da produção em outubro de 2024. O estado da Geórgia e a autoridade local de desenvolvimento conjunto inicialmente adquiriram o terreno em 2021, com o objetivo de atrair a Hyundai.
Mesmo para uma fábrica menor, alcançar a produção em escala pode ser lento e caro. A Volvo Cars investiu cerca de US$ 1,35 bilhão (R$ 8,1 bilhões) em sua planta na Carolina do Sul desde que escolheu o local em 2015.
A fábrica começou a produção três anos depois e agora tem capacidade total de produção anual de 150 mil veículos, o que alguns executivos do setor dizem ser o mínimo necessário para tornar economicamente viável construir uma nova planta nos EUA.
Dada a atual incerteza nos EUA, algumas empresas podem buscar alternativas à construção de novas fábricas. Wakefield afirma que a maioria das montadoras tem capacidade suficiente em plantas existentes.
Também seria mais barato reiniciar instalações desativadas do que construir novas do zero. Os custos trabalhistas nos EUA significam que as fábricas dependerão fortemente da automação, mas encomendar equipamentos também leva tempo, e as tarifas também devem aumentar o custo de materiais e tecnologia do exterior.
A General Motors disse aos investidores em fevereiro que não poderia tomar decisões sobre onde moveria suas fábricas sem clareza política. “O mercado está precificando um grande impacto das tarifas e perda de lucratividade. Pense em um mundo onde, além disso, estamos gastando bilhões de dólares em capital e então isso acaba”, disse o diretor financeiro da GM, Paul Jacobson.
As tarifas também correm o risco de tornar mais caro construir novas instalações. “Mantendo todo o resto igual, as tarifas provavelmente aumentarão os custos”, afirma Daniel Ismail, diretor-gerente da analista imobiliária Green Street.
As tarifas prejudicaram a construção não residencial nos EUA ao injetar incerteza, de acordo com analistas do Morgan Stanley: “Os gastos com construção não residencial… provavelmente serão a maior vítima da incerteza do conflito comercial.”
Os produtos farmacêuticos foram excluídos das chamadas tarifas recíprocas anunciadas por Trump na semana passada. Em seu discurso no Rose Garden, ele elogiou as empresas que estavam se expandindo nos EUA e alertou que as fabricantes de medicamentos poderiam esperar um “grande imposto” se não seguissem o exemplo.
Construir uma fábrica que produz comprimidos usando equipamentos padrão levaria cerca de três anos, mas instalações complexas que produzem biológicos, como medicamentos de quimioterapia ou para obesidade, levariam cinco, diz Prashant Yadav, especialista em cadeia de suprimentos do think-tank com sede em Nova York, o Council on Foreign Relations.
Mesmo adicionar uma nova suíte de produção em uma fábrica existente poderia levar cerca de 18 meses, acrescentou.
Cortes na Administração de Alimentos e Medicamentos dos EUA correm o risco de atrasar inspeções e aprovações necessárias para fábricas farmacêuticas.
No entanto, algumas grandes empresas farmacêuticas, como Johnson & Johnson e Eli Lilly, anunciaram planos para expandir significativamente a manufatura nos EUA. Um executivo do setor disse que esses eram frequentemente planos existentes “embelezados com enfeites” na tentativa de agradar o presidente.
Trump também declarou sua ambição de “ressuscitar a indústria de construção naval americana”. Uma vez um importante construtor naval, os EUA agora são um pequeno jogador global em comparação com alguns países asiáticos.
Mas especialistas dizem que reviver a construção naval americana exigiria anos de investimento em novos estaleiros. Os EUA têm “zero” chance de se tornar uma nação significativa na construção naval durante o segundo mandato de Trump, disse Antonella Teodoro, consultora sênior da consultoria de transporte MDS Transmodal.
“Do lado otimista, pode levar cerca de cinco a dez anos para ter uma instalação competitiva em funcionamento”, disse ela. “Para alcançar o sucesso a longo prazo e competir globalmente, no entanto, pode levar mais tempo.”
Na produção de metais, os EUA tinham cinco fundições de alumínio ativas em 2023, de acordo com o governo dos EUA.
Para competir globalmente na produção de alumínio, os EUA precisariam construir fundições que possam produzir até 1 milhão de toneladas por ano, disse David Krakoff, ex-executivo da Kaiser Aluminum.
“Você está falando de sete anos até começar a ver metal quente”, acrescentou, considerando as licenças e o financiamento necessários para construir uma fundição dessa escala.
Patrick Temple-West
, Kana Inagaki
, Hannah Kuchler
, Oliver Telling
, Robert Wright
, Joshua Oliver
e Claire Bushey