Você entendeu as tarifas que Donald Trump anunciou na semana passada? Chamaram de “recíprocas”, mas elas não têm como base nenhuma taxa estrangeira, apenas a balança comercial entre os Estados Unidos e os países atingidos.
Quanto maior o déficit comercial atual, ou seja, mais importação do que exportação, por parte dos EUA, maior será a tarifa. O cálculo foi publicado pela Casa Branca, depois do showmício de seu atual morador. A metralhadora de taxas não poupou, entretanto, países com os quais os EUA são superavitários, como o Brasil. Apenas deixou-os na faixa mais branda, com tarifas de 10%.
Taxar importações para tentar equilibrar a balança comercial parece tão eficiente quanto continuar cavando para sair de um buraco. Mas os investidores precisam trabalhar com a realidade posta. E aí está ela.
O anúncio das taxas permitiu colocar em números a nova ordem econômica alardeada pelo presidente dos EUA. A economista-chefe do Ouribank, Cristiane Quartaroli, conta que as projeções de crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) mundial para este ano foram derrubadas de 3,5% para 2,5%. Ao Monitor do Mercado ela disse que o PIB do Brasil deverá sofrer um impacto negativo de 0,5 ponto percentual.
Atingida pela maior onda do tsunami tarifário (34% adicionais), a China já contra-atacou, impondo outros 34% para produtos dos EUA. Em entrevista à revista Veja, o embaixador da China no Brasil, Zhu Qingqiao, deu a entender que o gigante asiático pretende dobrar a aposta. As novas cobranças, disse, “violam as regras da Organização Mundial do Comércio, abalam a estabilidade das cadeias globais e impedem o desenvolvimento das economias”.
No Brasil, o presidente Lula falou em “medidas cabíveis para defender nossas empresas e trabalhadores”. Mas ainda é fumaça.
Na negociação de Trump, tudo é fumaça, aliás. Quem leu o livro “Medo: Trump na Casa Branca”, do premiadíssimo Bob Woodward, entende que o presidente dos EUA vocifera “verdades absolutas” que podem ser desmentidas por ele mesmo horas depois, sem o menor problema.
Na quinta-feira (3), enquanto as Bolsas dos EUA sofreram a maior queda diária desde a Covid-19, a nossa conseguiu segurar um 0 a 0. Já na sexta (4), não havia mais onde se segurar: preços despencaram lá e cá, mostrando que o apetite ao risco saiu da mesa.
Nesses momentos, agir no desespero costuma dar errado. Quem compra uma ação “porque o preço caiu” pode ver seu valor chegar a zero, com o mico no bolso. Com a nossa taxa básica de juros perto de 15% ao ano, os títulos de renda fixa praticamente livres de risco seguem na dianteira, na corrida pelos investidores.
A FecomercioSP (Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo) disse à Folha que o Brasil poderia ganhar se aproveitasse o embalo para aumentar importações. Analistas também apontam que as travas dos EUA podem ampliar as conexões do Brasil com a China e outros mercados.
Tudo, entretanto, ainda depende de muitas variáveis. Como disse o lendário investidor Howard Marks, há uma profunda incerteza sobre tudo, exceto a de que haverá mais inflação.
Quem tem dinheiro em caixa pode esperar um pouco e fazer melhores jogadas quando todas as peças estiverem no tabuleiro.
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