Em um escritório modesto que se assemelha mais a uma startup do que a uma torre de marfim, Yossapong Laoonual, presidente honorário da Associação de Veículos Elétricos da Tailândia, adota um tom otimista.
Apegar-se ao motor de combustão interna é “como insistir em carruagens puxadas por cavalos muito tempo depois que os veículos motorizados se tornaram o padrão”, diz ele.
Um passeio pelo campus de Yossapong na Universidade de Tecnologia King Mongkut Thonburi em Bangkok faz com que tal otimismo pareça completamente natural. Três ônibus elétricos estão estacionados ao lado de um ponto de carregamento, e placas descrevem o plano de neutralidade de carbono da faculdade de engenharia.
Governos do Sudeste Asiático estão apostando que Yossapong está certo. Muitos na região, particularmente Tailândia, Indonésia e Vietnã, querem uma fatia do crescimento global dos veículos elétricos. Ao fomentar o investimento relativamente cedo, a ideia é que eles possam se tornar centros de produção cruciais, com benefícios colaterais como a redução da poluição do ar. Mas o sucesso está longe de ser garantido, e grandes investimentos estão sendo feitos, enquanto muitos esquemas parecem um pouco imprudentes.
A Tailândia tem sido a mais agressiva dos três países, esperando que um mercado consumidor em expansão atraia a produção. Sob o projeto “EV 3.0” lançado em 2022, as compras são subsidiadas por meio de cortes de impostos e pagamentos diretos de até 150 mil baht (R$ 26,3 mil) por veículo, o que significa que os veículos elétricos não custam mais do que carros comuns. De quase nada há alguns anos, sua participação nas vendas disparou para cerca de 15%.
Na Indonésia, essa participação é de 5%; o número mais baixo é em parte explicado pelo fato de o governo estar mirando os produtores em vez dos consumidores. A Indonésia lançou uma mistura de incentivos, que vão desde isenções fiscais até vantagens de investimento. Mas o país também está tentando aproveitar ao máximo seu domínio de minerais necessários para os elétricos, usando proibições de exportação para forçar as empresas a produzir localmente.
Por exemplo, no níquel, onde a Indonésia desfruta de um quase monopólio, uma proibição de exportação de minério bruto que entrou em vigor em 2020 levou a investimentos em fundições.
Enquanto isso, o Vietnã está apostando na VinFast, sua campeã nacional. A empresa, um desdobramento do principal conglomerado do Vietnã, que tem ligações com o Estado, dominou o mercado doméstico desde 2022, quando começou a vender exclusivamente carros elétricos.
Uma investida nos Estados Unidos falhou —”funções básicas não funcionam de forma confiável”, escreveu um dos críticos mais brandos do VF8 da VinFast—, mas novas expansões na Índia e na Indonésia estão em andamento. Em uma nova concessionária da empresa em Jacarta, os motoristas são convidados a adotar uma “imaginação sem limites”.
A VinFast recebe algum apoio financeiro do Estado, incluindo um plano recente para subsidiar a eletricidade em 150 mil estações de carregamento (em grande parte de propriedade da própria empresa). Mais significativo é o apoio político. Como observa Marco Förster, da consultoria Dezan Shira & Associates, a empresa é um “projeto de glória” ao qual os líderes do Vietnã estão profundamente ligados.
Cada abordagem encontrou suas próprias dificuldades. A Tailândia já é o maior produtor de automóveis do Sudeste Asiático, com empresas automotivas japonesas contando com seus fornecedores de peças. No entanto, os carros elétricos exigem menos peças do que os carros comuns. Além disso, os fabricantes de elétricos chineses na Tailândia dependem de peças fabricadas em casa.
A política da Tailândia, portanto, corre o risco de uma redução líquida nos empregos de fabricação de automóveis. Fabricantes de peças do país já estão reclamando de uma queda acentuada nos pedidos. Em resposta, um novo esquema “EV 3.5” aperta os requisitos locais e reduz os subsídios. Os ministros também começaram a aumentar o apoio aos híbridos, para os quais os produtores japoneses da Tailândia estão mais bem preparados.
Embora a estratégia industrial da Indonésia tenha parecido atrair fabricantes, a realidade é menos animadora. Entre 2016 e 2024, a Indonésia recebeu US$ 29 bilhões (R$ 169 bi) em investimento estrangeiro direto relacionado a veículos elétricos, de acordo com o think-thank Lowy Institute. No entanto, grande parte disso é de empresas chinesas, que novamente montam veículos a partir de kits importados.
Em princípio, elas estão sujeitas a requisitos de conteúdo local que aumentam com o tempo, mas não está claro quão agressivamente a Indonésia aplicará essas exigências. Críticos acusam o governo de concessões fiscais que valem muito mais do que os benefícios que chegam aos indonésios.
E a VinFast está penando muito. Apesar do aumento nas entregas e na receita, nunca teve lucro. A empresa vende carros com uma perda acentuada; sua margem bruta é de -45% e os preços estão caindo, com as últimas reduções anunciadas em 2 de março. A VinFast sobreviveu apenas graças à generosidade de seu proprietário. Pham Nhat Vuong, um bilionário que também dirige o conglomerado mais amplo, prometeu US$ 2 bilhões de sua riqueza pessoal para a empresa. Ele também usou os recursos do conglomerado para sustentar sua subsidiária. Em 2023, cerca de 90% da receita da VinFast veio de vendas para outras empresas controladas por Vuong, de acordo com a Hunterbrook, um fundo de hedge e mídia.
Os três locais agora enfrentam riscos semelhantes. Um é que —em um momento de excesso de oferta global de elétricos impulsionado pela produção chinesa— os recursos sejam desperdiçados. Outro é que eles se encontrem presos como centros de montagem, uma parte do processo de baixo valor agregado.
Vantagens que antes sustentavam a fabricação tradicional de automóveis, como boas redes de produção, podem importar menos para os elétricos, onde a maior parte do valor é direcionada para software e engenharia elétrica, observa Pavida Pananond da Escola de Negócios de Thammasat.
O problema subjacente é que o Sudeste Asiático está cheio de tomadores de tecnologia —ou seja, depende de expertise estrangeira, em grande parte chinesa. Os formuladores de políticas locais esperam combinar doações com requisitos de transferência de tecnologia.
No entanto, é difícil fazer com que empresas estrangeiras aceitem essas demandas devido ao pequeno tamanho dos mercados do Sudeste Asiático, bem como à capacidade dos chefes de jogar países uns contra os outros, diz Tu Le da consultoria Sino Auto Insights. A Indonésia, o maior mercado dos três, depende fortemente do investimento chinês, dificultando sua capacidade de ser rigorosa com as empresas chinesas.
Os otimistas esperam que os fabricantes da China eventualmente se estabeleçam em alguns centros regionais, o que daria aos governos anfitriões mais influência na localização da produção, como a Tailândia conseguiu com os fabricantes de automóveis japoneses na década de 1970. Mas a consequência é que, na melhor das hipóteses, apenas uma das apostas de política industrial de elétricos do Sudeste Asiático pode dar um grande retorno. E isso deixaria duas falhas custosas.
Texto de The Economist, traduzido por Helena Schuster, publicado sob licença. O artigo original, em inglês, pode ser encontrado em www.economist.com