Na cerimônia do Oscar, a produtora de “Anora” –com orçamento infinitamente menor do que alguns rivais e que ganhou cinco estatuetas, entre elas a de melhor filme– disse em seu discurso: “Para todos os que sonham, e para os jovens cineastas, contem as histórias que vocês querem contar. As que mexem com vocês. Prometo, não vão se arrepender.”.
Em um momento em que a comparação com o outro é constante, a mensagem é um necessário incentivo a ser autêntico e a acreditar no próprio potencial.
Com autenticidade e talento, entre muitos outros atributos, João Fonseca e Fernanda Torres se consolidaram como novos ídolos do Brasil. Esse trecho do discurso tem alguma relação com a trajetória deles.
A atriz e o tenista têm qualidades em comum: são carismáticos, entendem sua importância em representar o Brasil mundo afora e demonstram em suas entrevistas e atitudes o orgulho de fazer isso.
Fernanda, como uma atriz consagrada e experiente; João, aos 18 anos e no início de uma potencial brilhante trajetória. E, em meio a tantas estrelas do cinema e do esporte que, seja por excesso de media training ou por falta de conteúdo, têm discursos vazios, é animador ouvir João e Fernanda sempre falando de forma tão genuína.
Aqui, do outro lado do oceano, João é elogiado pelos grandes do tênis e Fernanda por especialistas em cinema e pelo público. Antes da entrega do prêmio de melhor atriz, a comentarista do canal de TV inglês no qual eu assistia à cerimônia disse: “Fernanda não vai vencer, mas deveria”. O reconhecimento ao talento de ambos é inquestionável.
O fato de o torneio Rio Open e o Oscar terem sido, respectivamente, um pouco antes e durante o Carnaval, tornou o momento ainda mais especial. Ver crianças empolgadas com tênis, assistindo na televisão ou nas arenas cheias, multidões celebrando a vitória de “Ainda Estou Aqui”, mostra que os brasileiros valorizam cultura e esporte e irão acompanhá-los se houver incentivo para isso.
É bom lembrar, no entanto, que é preciso paciência e compreensão. Em qualquer competição, existe o imponderável e o mérito do rival. Além disso, em muitas profissões, meritocracia não existe quando não se parte do mesmo patamar financeiro.
Em disputas internacionais, brasileiros muitas vezes saem em desvantagem, mesmo com mais talento do que adversários de outros países. Têm que furar eurocentrismo, barreira do idioma, distância geográfica dos principais centros na Europa e Estados Unidos. No Brasil, políticas públicas não focam como deveriam nesses dois setores, e depender de incentivos privados no cinema e de “paitrocínios” no início da carreira esportiva cria um abismo financeiro quando é preciso competir em euros e em dólares.
Por isso, o fato de João e Fernanda (e estendo os méritos a toda a equipe do filme), para começar, terem conseguido furar essa bolha, é digno de muitos, muitos aplausos.
Para políticos e gestores, deveria ser óbvio: investir nas áreas artística e esportiva é uma forma eficaz de promover a imagem do Brasil e receber oportunidades em troca. Apesar de tudo, é como temos sido admirados nas últimas décadas internacionalmente.
E é parte de algo mais profundo: sem arte e esporte, um país não cria nem reconhece a própria identidade.
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