O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sancionou nesta quinta-feira (10) o Orçamento de 2025 com apenas dois vetos, mas integrantes do governo já calculam a necessidade de repor cerca de R$ 4 bilhões que foram cortados do programa Mais Médicos e das ações voltadas à saúde indígena.
Os recursos foram remanejados pelos parlamentares para outras ações discricionárias, como investimentos do Novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), durante da tramitação do texto no Congresso Nacional, mas o Executivo avalia que a decisão pode colocar em risco a continuidade das políticas.
Segundo um técnico do governo, os valores aprovados para o Mais Médicos e para a saúde indígena garantem os pagamentos apenas até o fim de abril. Em maio, já não haveria dinheiro suficiente para honrar os compromissos. São casos drásticos que exigirão providências imediatas, de acordo com o interlocutor.
O governo propôs originalmente uma dotação de R$ 4,8 bilhões para a formação e provisão de profissionais de saúde no âmbito do Mais Médicos, mas o Congresso reduziu o valor para R$ 2,2 bilhões. Isso significa um corte de 51,4%.
Nas ações de saúde indígena, os parlamentares diminuíram os recursos de R$ 2,8 bilhões para R$ 1,3 bilhão. A redução de 54,4% ocorre num momento de alta na incidência de doenças em territórios indígenas.
Na tramitação, o Congresso remanejou ao todo cerca de R$ 11 bilhões dentro das despesas discricionárias do Poder Executivo.
O valor não se confunde com as emendas parlamentares, usadas pelos congressistas para irrigar seus redutos eleitorais. Apesar disso, as mudanças foram vistas fora do governo como uma forma de o Legislativo ampliar seu controle sobre o Orçamento, driblando os limites fixados após acordo negociado com o STF (Supremo Tribunal Federal).
No Executivo, porém, a leitura é distinta, já que os recursos remanejados foram direcionados para políticas nacionais (ou seja, não há um carimbo explícito que canalize a verba para determinada região). Além disso, o governo dispõe de instrumentos para remanejar até 30% das verbas discricionárias (ou até 25% no caso do PAC) sem precisar de autorização prévia do Legislativo —o que não ocorre no caso das emendas típicas.
A recomposição de despesas da Saúde é apenas um dos desafios que o governo precisará enfrentar após a sanção do Orçamento.
Como mostrou a Folha, a equipe econômica optou por não fazer todo o ajuste nas despesas obrigatórias antes da aprovação da lei orçamentária, ocorrida em março deste ano, com atraso.
O governo encaminhou um ofício pedindo um aumento de R$ 8,3 bilhões nas despesas com benefícios previdenciários e de R$ 678 milhões com o BPC (Benefício de Prestação Continuada), destinado a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda. Mas os valores são insuficientes diante da trajetória esperada para esses gastos ao longo de 2025.
Os técnicos decidiram fazer um primeiro ajuste, ainda que parcial, e acompanhar a evolução dessas despesas nos primeiros meses do ano para então incorporar novos aumentos. Há expectativa de que será necessário congelar recursos discricionários (como custeio e investimentos) para acomodar a expansão das despesas obrigatórias.
O governo de Lula já baixou um decreto para segurar a execução de gastos neste início de ano, justamente com o objetivo de formar uma espécie de reserva para facilitar esses bloqueios nos próximos meses.
A sanção do Orçamento foi publicada em edição extra do Diário Oficial da União desta quinta. Lula efetuou apenas dois vetos. Um deles pode incidiu sobre uma verba de R$ 2,97 bilhões alocada no FNDCT (Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico).
A aprovação do pacote de contenção de gastos no fim do ano passado prorrogou a DRU (Desvinculação de Receitas da União), mecanismo que permite flexibilizar o uso de até 30% dos recursos carimbados por lei para determinadas áreas.
Antes da prorrogação desse instrumento, a proposta orçamentária foi enviada com R$ 10,3 bilhões para o FNDCT. O Congresso promoveu a desvinculação formal ao segregar esses quase R$ 3 bilhões, mas manteve o recurso alocado no fundo, o que contraria as regras. O Ministério do Planejamento e Orçamento recomendou o veto a este trecho.
Na justificativa, o governo diz que a lei limita o montante anual dos empréstimos reembolsáveis do fundo a 50% das dotações previstas. Ao aplicar a DRU, o Congresso reduziu as despesas primárias, mas não as financeiras, que ficaram acima do limite de 50%. Segundo o Executivo, a medida está em desacordo com a lei e contraria o interesse público, daí a necessidade de vetá-la.
Lula também barrou R$ 40,2 milhões em emendas feitas pelos parlamentares na despesa discricionária do Executivo e que foram alocadas para regiões ou municípios específicos. Pelo acordo com o STF e com o Congresso, esse tipo de emenda fica sob a alçada do limite de R$ 50,4 bilhões, já preenchido pelos parlamentares.
“Em que pese a boa intenção do legislador, a inclusão das referidas programações contraria o interesse público”, disse o governo, citando desacordo com a nova lei que regulamentou o acordo das emendas.