Governos estaduais planejam realizar novos investimentos, sobretudo em infraestrutura, para tentar manter a atratividade local diante da retirada de benefícios fiscais promovida pela reforma tributária. O novo modelo coíbe a concessão de incentivos hoje usados como chamariz para empresas se instalarem numa região.
Algumas companhias já estudam se mudar para locais mais próximos das grandes cidades, onde estão os principais centros consumidores do país.
A partir de 2029, estados e municípios contarão com transferências adicionais por meio do FNDR (Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional), a ser custeado pela União, para dar incentivos financeiros ou fazer investimentos. O repasse anual alcançará R$ 40 bilhões em 2033 e R$ 60 bilhões a partir de 2043.
Alguns estados da região Norte ainda terão acesso ao Fundsam (Fundo de Desenvolvimento Sustentável dos Estados da Amazônia Ocidental e do Amapá), ainda sem volume definido de recursos.
Embora haja a expectativa de ganhos de eficiência e produtividade com a simplificação dos tributos sobre o consumo, a reformulação do sistema vai transferir a cobrança da origem (onde os bens e serviços são produzidos) para o destino (onde ocorre o consumo).
A chamada transição federativa, que busca suavizar os impactos dessa redistribuição de receitas no caixa de estados e municípios, terá uma duração longa, de 50 anos. Ela será invisível para os consumidores, mas crucial para evitar o risco de um desfalque repentino nas contas de quem tem um mercado consumidor menor.
Ao todo, 12 dos 15 estados que responderam aos questionamentos da Folha listaram a manutenção de receitas ou a reforma propriamente dita como um dos principais desafios dos próximos anos.
O Espírito Santo diz vislumbrar “desafios significativos” diante da expectativa de perda de arrecadação. A reforma é considerada um dos temas fundamentais do planejamento de longo prazo do estado, que está sendo reformulado.
O governo capixaba aposta na “localização estratégica” e em melhorias na infraestrutura para atrair novos investimentos e dar sustentação à economia.
Santa Catarina diz que, sem poder contar com os incentivos “como moeda de troca”, a nova lógica de atração de investimentos “passará pelo custo da logística, pela qualificação e custo de mão de obra, além da disponibilidade e custo de energia”.
“A política de atração de investimentos via benefícios fiscais vai dando espaço para uma política baseada em outros critérios”, afirma o estado, citando a saúde fiscal como um fator para poder “criar suas lógicas financeiras e garantir os estímulos necessários”.
Na região Nordeste, estados como Alagoas esperam ganhos com a reforma. O governo de Sergipe também prevê benefícios, mas afirma que a retirada dos incentivos pode gerar desafios. O Banese (Banco do Estado de Sergipe) trabalha em instrumentos financeiros para captar novos investidores.
O governo de Rondônia afirma que tem a expectativa de aplicar os recursos do Fundsam em investimentos na infraestrutura logística para atrair novos empreendimentos produtivos.
A CNM (Confederação Nacional dos Municípios) vê na reforma espaço para um maior empoderamento das prefeituras no processo decisório sobre os rumos da tributação e lançou uma cartilha sobre o tema.
A FNP (Frente Nacional de Prefeitos), que representa médias e grandes cidades, diz que municípios mais populosos e que pouco produzem tendem a gerar mais receitas, enquanto aqueles que produzem muito, mas um mercado consumidor menor, tendem a sofrer uma redução.
Antes mesmo de acessarem os fundos da reforma tributária, a expansão das transferências da União para os governos regionais desde 2019 tem engordado os cofres desses entes.
Segundo o economista Bráulio Borges, economista-sênior da LCA 4intelligence, pesquisador associado do FGV Ibre e colunista da Folha, os repasses estão hoje cerca de R$ 200 bilhões acima do patamar pré-pandemia de Covid-19, valor mais que suficiente para suplantar as perdas de R$ 100 bilhões impostas pela lei que limitou as alíquotas de ICMS sobre combustíveis, aprovada em 2022.
Parte do prejuízo foi alvo de um acordo, no qual a União aceitou pagar uma indenização total de R$ 27 bilhões, repartida entre estados e municípios.
Além disso, desde 2023, alguns estados vêm ajustando suas alíquotas para recompor a arrecadação. Das 14 unidades da federação que responderam a este questionamento, nove informaram ter elevado o ICMS em algum momento nos últimos dois anos.