Antes de se tornar uma executiva, Paula Harraca foi goleira da seleção júnior de hóquei da Argentina, onde nasceu. Lesões a tiraram do esporte, que, segundo ela, ensinaram-lhe a resiliência, hoje importante na sua estratégia de redução do endividamento da Ânima Educação, grupo que ela comanda desde junho passado.
Harraca, que se acha “meio rebelde”, mergulhou em uma ramo que ela mal conhece e, para exercer seu papel, conta com a equipe. “Não existe essa de CEO super-herói e isso vale tanto para homem, quanto para mulher”, diz.
Esta é a primeira vez que preside uma companhia?
Sim. Empresa nova, cargo novo, setor novo, muitas novidades. Ainda estou aprendendo muito.
Mas sua missão é dura. A Ânima vale na Bolsa menos de um terço do que tem de patrimônio. Como reverter?
Faz oito meses que estou na companhia. Passei um bom tempo ouvindo, para entender o negócio. Temos uma rede com 15 mil professores, que conhecem a educação como ninguém. Por outro lado, minha curiosidade me leva a questionar coisas que antes eram imutáveis e não faziam muito sentido. O plano é, em médio prazo, dobrar a companhia de tamanho, mirando um mercado de R$ 100 bilhões.
Como?
Investindo em áreas em que somos muito bons. Na área de ensino superior, de cerca de R$ 50 bilhões, vamos avançar com crescimento orgânico. A Ânima não é uma instituição de ensino, é um ecossistema de aprendizagem. É isso o que permitirá nos reinventarmos. Nos outros R$ 50 bilhões, mais ou menos um terço é lifelong learning (aprendizado para vida inteira), essa oferta de cursos livres. Tem uma outra parcela, que é pós-graduação, da formação executiva. E há a vertente B2B, que são as empresas com suas demandas de treinamento, de formação, que vão do C-level [comando] às posições de entrada.
O que lhe faz acreditar que o mercado vai acreditar no seu plano e investir na empresa?
Muitas vezes as perguntas que [os investidores] fazem é sobre o que a gente não controla. Claro que temos cenários definidos se os juros subirem mais ou as condições macro de navegação piorarem. Somos realistas e cautelosos.
Mas a nossa energia está no principal: fazer muito bem aquilo a que nos propusemos. E começamos a tirar do papel nossa estratégia. A gente falou [para analistas de mercado] o que faria e fizemos, porque uma das principais palavras quando se fala de mercado é confiança. A outra é resultado.
Nesse plano, vocês lançaram um programa em que o estudante universitário com uma ideia empreendedora pode receber investimento. Como ganham dinheiro com isso?
Alunos que propõem soluções inovadoras e com vocação de empreender ou de querer resolver algum desafio, um problema da sociedade, do seu bairro, a Ânima vai ser investidora, tornando-se sócia desses alunos pelo resto da vida. O programa, Titan Labs, foi lançado recentemente.
Viraram investidores-anjo?
Isso. Vamos acompanhar esse aluno, não só na formação dele [lifelong learning], trazendo também o professor junto para essa composição. A educação não tem preço, tem valor. Educação não é custo, é investimento e ele dá retorno, tanto que a Ânima entrou nesse negócio, através de um veículo de investimento.
É mais difícil ser mulher e CEO?
Quando cheguei no Brasil, eu estava grávida da minha primeira filha. Fui para Vila Velha (ES) com uma barriga de 40 semanas. Tinha acabado de ser promovida, tendo de dar conta de um monte de coisas. Uma pessoa muito querida veio me dar uma dica: ‘olha, a mulher brasileira faz a unha, tá?’ Olhei para ela, agradeci, e disse que só faria a unha se eu quisesse, não porque a mulher brasileira faz. Nesse sentido, sou meio rebelde, sabe? Só faço o que quero. Por dentro, pensei: ‘tadinha da mulher brasileira, quantos mandatos sociais ela tem?’ Porque, se ela tem, se cobra e fica em dívida. Então, menos! Menos mandato, se cobre menos. Escolha três coisas para fazer e delegue as outras.
RAIO-X
Paula Harraca, 44
Fez carreira como chefe de recursos humanos na ArcelorMittal, siderúrgica em que atuou por quase 20 anos antes de aceitar o convite dos fundadores da Ânima para comandar a empresa como CEO. É autora de “O poder transformador do ESG: como alinhar lucro e propósito”, pela editora Planeta.
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