Em 2010, na euforia da descoberta do pré-sal, o governo fez o equivocado diagnóstico de que as rendas futuras de petróleo pagariam, com sobra, toda a despesa pública.
Mesmo com o sucesso da exploração do pré-sal, isso nem de longe aconteceu. Em 2024, o total de rendas de petróleo da União foi de R$ 107 bilhões, enquanto o seu déficit nominal somou R$ 900 bilhões.
Na crença de que nos tornaríamos uma nova Arábia Saudita, foi criado o Fundo Social, onde seria depositada parte do esperado superávit nominal, para acumular poupança em benefício das gerações futuras.
O superávit não veio. Criar fundo de poupança em país deficitário equivale a tomar dinheiro no cheque especial para depositar na caderneta de poupança: prejuízo certo.
Com dívida e juros altos, o melhor que se pode fazer pelas gerações futuras é não lhes legar uma dívida ainda mais alta e cara: controlar a despesa e usar a renda do petróleo para pagar as contas correntes, evitando endividamento adicional.
Escolheu-se, contudo, criar o Fundo Social, que, abastecido por rendas de petróleo da União, faria investimentos no exterior. O principal investido seria preservado, gastando-se apenas os rendimentos em oito áreas escolhidas pelo Congresso, que vão de educação a esportes.
As instâncias de governança desse fundo, previstas na lei, que planejariam e executariam os investimentos, jamais foram criadas. Os investimentos não foram feitos e os recursos se acumularam na conta única do Tesouro.
Em 2013 já estava claro que os investimentos no exterior não decolariam. Foi então autorizado o gasto de 50% dos valores do fundo em educação e saúde. A outra metade do fluxo de receitas continuou acumulando saldo no fundo.
De tempos em tempos passava-se uma lei para desvincular esse saldo, usando-o para pagar dívida pública, o que é correto.
Chegamos ao presente, em que ainda há recursos empoçados no Fundo Social e novos fluxos mensais de receita aumentam esse saldo mês a mês.
O governo não pode usar esse dinheiro para aumentar despesa primária, porque há um teto de gastos, determinado pela lei do arcabouço fiscal, que já está totalmente consumido.
Deveria extinguir o Fundo Social, que se provou inútil, e usar o saldo e os novos fluxos de receita para reduzir o déficit público, o que faria a dívida crescer mais lentamente.
Contudo, o governo preferiu uma linha alternativa. Aprovou, em setembro de 2024, uma lei desvinculando R$ 20 bilhões do fundo, repassando-os ao BNDES, para constituir funding para empréstimos.
O truque é que esse desembolso não é despesa primária, logo não se submete ao teto de gastos. Entre controlar o crescimento da dívida e fazer política pública de expansão de crédito, o governo escolheu a segunda opção.
A dose se repete com a recente edição da MP 1.291, que não extinguiu o Fundo Social, mas acabou com a fantasia dos investimentos no exterior, colocando os recursos disponíveis para uso do orçamentário corrente.
Porém, novamente para evitar o teto de gastos, o governo já informou ao Congresso que vai usar a via do desembolso financeiro, mandando R$ 21 bilhões para concessão de financiamentos via bancos públicos.
Em tese, uma vez que os tomadores finais quitem os empréstimos feitos pelos bancos públicos, os recursos poderiam voltar para o Tesouro e serem usados para pagar dívida pública. Na prática, os recursos permanecem nos bancos, financiando novas operações, e são parcialmente consumidos por inadimplência, subsídios nos juros e taxas de administração.
Enquanto isso, a dívida pública continua subindo.
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