Empresas se comprometeram a investir pelo menos US$ 1,9 trilhão (R$ 11,4 trilhões) nos EUA desde o início da presidência de Donald Trump, mas a bonança de gastos pode ser ameaçada pela guerra tarifária em espiral.
As promessas de investimento de empresas estrangeiras e americanas chegaram a US$ 1,9 trilhão, de acordo com uma análise do Financial Times. Isso se compara a US$ 910 bilhões em investimentos privados em manufatura anunciados desde o início da presidência de Joe Biden até outubro de 2024, segundo o departamento de comércio dos EUA.
Os compromissos mais recentes incluem US$ 100 bilhões da SoftBank, que fez o compromisso em dezembro, e da fabricante de chips TSMC, US$ 20 bilhões do grupo de transporte marítimo francês CMA CGM, uma promessa de US$ 500 bilhões da Apple e US$ 5 bilhões da montadora Stellantis.
No entanto, muitas das promessas vêm de empresas com cadeias de suprimentos globais que são vulneráveis às tarifas abrangentes que Trump anunciou contra parceiros comerciais, incluindo China, Índia e UE.
Teresa Fort, professora associada e especialista em comércio internacional no Dartmouth College, diz que o dano das tarifas de Trump irá muito além das promessas de investimento de US$ 1,9 trilhão já feitas: “A quantidade de incerteza que ele introduziu no sistema de comércio mundial significa que ninguém está em posição de fazer investimentos de longo prazo. Isso definitivamente tornará os EUA um lugar menos atraente para investir.”
Trump disse no final de março que o dinheiro estava “entrando” por causa de suas políticas comerciais. Mas depois que ele revelou uma tarifa de 20% sobre as importações da UE, o presidente francês Emmanuel Macron pediu às empresas para pausarem os investimentos nos EUA enquanto seu governo trabalha com a Comissão Europeia na resposta da UE.
“Que mensagem enviaríamos ao ter grandes atores europeus investindo bilhões de euros na economia americana em um momento em que [os EUA] estão nos atingindo?” disse Macron, pedindo às indústrias que também se abstenham de tentar negociar isenções com Washington.
O ministério das Relações Exteriores do Japão disse na segunda-feira (7) que o primeiro-ministro Shigeru Ishiba “expressou fortes preocupações de que as medidas tarifárias dos EUA poderiam enfraquecer a capacidade de investimento entre as empresas japonesas” em uma ligação telefônica com Trump. O Japão é a principal fonte de investimento estrangeiro nos EUA.
Alguns analistas argumentam que as políticas protecionistas de Trump poderiam acelerar o investimento na produção nos EUA à medida que os países tentam obter concessões. No início deste ano, o Capgemini Research Institute estimou que as empresas americanas deveriam gastar US$ 1,1 trilhão na reindustrialização da manufatura nos EUA nos próximos três anos, acima dos US$ 750 bilhões previstos para 2024.
Mas Scott Lincicome, vice-presidente do think-tank de livre mercado Cato Institute, diz que uma queda nos lucros corporativos, custos de produção mais altos e uma desaceleração na economia dos EUA como resultado das tarifas poderiam diminuir o apetite por investimentos.
“Quem quer que tenha planejado usar esses anúncios de investimento para fazer as tarifas desaparecerem ou desacelerarem provou estar bastante equivocado”, afirma Lincicome. “É impossível olhar para as tarifas anunciadas como algum tipo de plano sistemático para induzir investimentos de longo prazo.”
A Stellantis, que fabrica caminhões Jeep e Ram, já disse que dispensaria 900 trabalhadores em cinco fábricas nos EUA e fecharia temporariamente a produção no Canadá e no México como resultado da incerteza tarifária.
Especialistas notaram a dificuldade em determinar quanto dos valores prometidos eram novos, bem como prever quanto disso realmente aconteceria. Promessas feitas durante o primeiro mandato presidencial de Trump incluíam alguns investimentos que já estavam planejados, enquanto não está claro quantos dos feitos durante a presidência de Biden se materializaram.
“Esses anúncios de investimento, feitos em janeiro ou fevereiro, não podem ser resultado da nova administração que está chegando”, disse um acadêmico americano focado em gestão, observando que o planejamento financeiro acontece em prazos mais longos.
A Apple anunciou US$ 500 bilhões de investimento em fevereiro, mas perdeu mais de US$ 300 bilhões em valor de mercado depois que Trump revelou suas tarifas, que afetarão seus centros de suprimento e produção na Ásia. A Apple já investe substancialmente nos EUA, então não está claro quanto pode ser atribuído a Trump.
A Hyundai da Coreia do Sul prometeu gastar US$ 21 bilhões ao longo de três anos para expandir sua produção de carros e negócios de aço nos EUA e criar 100.000 empregos. Apesar disso, carros fabricados no exterior vendidos nos EUA agora enfrentam uma tarifa de 25%.
Trump também anunciou uma tarifa adicional de 25% sobre todas as importações sul-coreanas.
A SoftBank, liderada pelo CEO Masayoshi Son, disse que superou uma promessa de US$ 50 bilhões feita após a primeira vitória de Trump em 2016, criando mais de 50.000 empregos, embora tenha demitido pessoas durante a pandemia.
Kirk Boodry, analista da Astris Advisory, disse que a SoftBank poderia ser forçada a vender ativos se as tarifas causassem uma prolongada queda de mercado — como aconteceu em 2020 durante a pandemia.