Grandes empresas e grupos sem fins lucrativos começaram a remover ou reescrever referências às mudanças climáticas em seus sites, espelhando ações semelhantes de departamentos do governo dos Estados Unidos em resposta às políticas de Donald Trump.
Uma análise do Financial Times mostra que declarações sobre mudanças climáticas de corporações como Walmart e Kraft Heinz foram deletadas ou reescritas no último ano, ao mesmo tempo em que uma reação republicana contra ações verdes se intensificou e as empresas começaram a retroceder em suas metas de zerar emissões líquidas.
Trump, que já chamou as mudanças climáticas de farsa, lançou um ataque abrangente à política ambiental desde que assumiu o cargo, enquanto sua administração começou a remover ou rebaixar menções às mudanças climáticas em sites do governo dos EUA.
Entre as empresas que anteriormente se gabavam de suas ações climáticas, a Walmart eliminou uma seção online em que anteriormente dizia estar “profundamente comprometida em enfrentar as mudanças climáticas”.
O site da varejista dizia no meio do ano passado: “As mudanças climáticas são um dos maiores desafios do nosso tempo. Se não tomarmos ações mais agressivas agora, os danos só piorarão, e as consequências serão desastrosas para esta e futuras gerações.”
Em dezembro, essas referências foram removidas e o texto foi significativamente encurtado e reescrito. A varejista, que não respondeu a um pedido de comentário, continuou a incluir em sua página que estava “focada em reduzir emissões em nossas operações [e] engajar fornecedores para reduzir emissões nas cadeias de suprimentos”.
Areeba Hamid, co-diretora executiva do Greenpeace UK, alertou que as empresas correm o risco de “cometer auto-sabotagem de marca ao apagar e diluir referências ao clima em seus sites”.
“Sabemos que clientes e funcionários se preocupam com a forma que as mudanças climáticas estão desestabilizando suas vidas porque o ar mais está ficando mais difícil de respirar, a água mais suja e os produtos mais caros”, disse ela. “Em última análise, enfrentar as mudanças climáticas é um negócio responsável e reforça as bases sobre as quais a prosperidade econômica é construída.”
Outros exemplos incluem a Kraft Heinz, que reescreveu sua página de Metas de Zero Emissões Baseadas na Ciência em janeiro, removendo uma referência do texto ao objetivo de cortar emissões em 50% até 2030. Em vez disso, a empresa escreveu que enfrentou “desafios internos e externos na entrega de nossas metas de zero emissões” e disse que estava reavaliando metas.
A Kraft Heinz disse ao FT que a página foi atualizada após seu último relatório ambiental, social e de governança, acrescentando que estava “totalmente comprometida com nossa ambição de zero emissões”.
Na página de mudanças climáticas da American Airlines, uma referência a como a “transição para baixo carbono é urgente e está em andamento” que aparecia em julho foi removida em novembro antes da eleição. A American Airlines disse que o “site foi atualizado com linguagem de nosso último relatório de sustentabilidade. Como o site mostra, nossas metas de sustentabilidade não mudaram.”
O gigante de tecnologia Meta, que não respondeu a um pedido de comentário, incluiu uma seção em sua página de sustentabilidade no verão passado sobre “liderar o caminho nas mudanças climáticas” e “tomar ações climáticas ousadas”. Essas referências foram removidas desde então, embora o site ainda diga que a empresa trabalha com parceiros para enfrentar as mudanças climáticas.
A Ford também removeu do topo de sua página de sustentabilidade no Reino Unido uma menção ao objetivo de “focar em ações contra as mudanças climáticas”, onde publicou um novo relatório sobre mudanças climáticas. Agora, o trecho fica mais abaixo na página. A empresa se recusou a comentar.
Enquanto isso, a Coca-Cola suavizou declarações sobre enfrentar o desperdício em sua página de sustentabilidade após enfraquecer suas metas ambientais em dezembro passado. A empresa não respondeu a um pedido de comentário.
Empresas não americanas também alteraram seus sites. Um gráfico sobre o uso de energia renovável em locais de fabricação da Nestlé foi removido da página de mudanças climáticas da empresa, assim como detalhes sobre o plantio de árvores. A Nestlé disse que o gráfico e as informações sobre o plantio de árvores ainda aparecem em outras partes de seu site.
Ben Caldecott, diretor do Oxford Sustainable Finance Group, alertou que o chamado greenhushing, onde as empresas minimizam seus esforços ambientais, “mina a transparência e a responsabilidade”.
Organizações de caridade também disseram ao FT que estavam reorganizando seus sites, com um grupo sem fins lucrativos dos EUA que opera internacionalmente dizendo que haviam apagado páginas inteiras sobre mudanças climáticas online, em parte para ajudar a garantir subsídios dos EUA.
Trump apoiou um congelamento de financiamento que interrompeu a ajuda humanitária e o trabalho de desenvolvimento dos EUA ao redor do mundo, incluindo o trabalho da Usaid (Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional). Isso gerou temores de que grupos sem fins lucrativos terão dificuldades para acessar subsídios dos EUA para projetos de desenvolvimento climático.
Outros disseram que projetos de mudanças climáticas estavam sendo rebatizados com outros títulos, destacando um foco em alimentos ou água, por exemplo.
Uma pessoa familiarizada com o pensamento do Programa Mundial de Alimentos da ONU disse que mesmo antes dos cortes da Usaid já havia expectativas de que os projetos precisariam ser rebatizados.
“Não vamos falar sobre eles em termos de mudanças climáticas, vamos falar sobre eles como resiliência, basicamente usar frases como mudanças climáticas vai ser apenas uma provocação.”