O aumento das tarifas de Donald Trump sobre as importações chinesas para níveis extraordinários —enquanto dava um alívio parcial a outros países— deu um golpe nas relações comerciais entre as duas maiores economias do mundo.
Na terça-feira (8), Trump elevou as tarifas sobre as importações chinesas para 104%. Na quarta-feira (9), ele aumentou para 125%. Na quinta-feira (10), a Casa Branca “esclareceu” que a taxa era agora, de fato, de 145%.
No entanto, desde o anúncio de terça-feira, o índice CSI New Energy de ações chinesas de energia limpa subiu mais de 3%, superando ligeiramente um aumento de 2,9% no mercado mais amplo de Xangai.
Investidores em energia verde dizem que ainda há fortes perspectivas de crescimento para a energia limpa chinesa, tanto em seu mercado interno quanto no exterior, mesmo com um colapso das exportações para os EUA, que já estavam altamente restritas. Mas para os investidores em empresas de energia limpa dos EUA, as consequências das tarifas de Trump podem se mostrar mais graves.
As ações chinesas em energia limpa e outras áreas sofreram, junto com a maior parte do mercado de ações global, em meio à turbulência das últimas duas semanas. E o salto nas bolsas chinesas foi claramente ajudado por intervenções da “equipe nacional” de entidades financeiras estatais.
Mesmo assim, a modesta recuperação nas ações chinesas de tecnologia verde —impulsionada pela redução das tarifas propostas dos EUA para outras nações, aliviando as sombras que pairam sobre a economia mundial— destaca como essas empresas podem se beneficiar da expansão da demanda global, mesmo que estejam amplamente excluídas dos EUA.
Para os produtores chineses de veículos elétricos, o impacto das novas tarifas foi “insignificantes, porque eles já estavam efetivamente bloqueados desse mercado” por meio de tarifas pesadas e outras restrições impostas pela administração de Joe Biden, disse Deirdre Cooper, chefe de ações sustentáveis na gestora de ativos Ninety One.
Algumas outras empresas na China sofreriam um impacto maior, disse Cooper —principalmente aquelas que fornecem componentes para o setor de energia renovável dos EUA. Segundo ela, a primeira coisa que fez, após a reeleição de Trump, foi vender uma posição na Sungrow, uma empresa chinesa que fabrica inversores para usinas de energia solar e realizava grande parte de suas vendas para clientes dos EUA.
Outra área significativa de exportações chinesas para os EUA são as baterias de íons de lítio para carros elétricos e armazenamento em nível de rede, este último cada vez mais importante à medida que as concessionárias buscam integrar energia solar e eólica intermitente.
A CATL, a maior fabricante de baterias do mundo, foi prejudicada pelas novas tarifas, com seu preço das ações caindo 10% desde o anúncio inicial do “dia da libertação” de Trump na semana passada.
Mas o crescimento do investimento em energia limpa na China e em outros mercados de exportação compensaria as vendas perdidas nos EUA, segundo Jon Forster, gerente sênior de portfólio do Impax Environmental Markets Investment Trust, que investiu na CATL no ano passado, quando as tensões comerciais já eram sérias.
“Levamos em conta o risco político e assumimos que seus negócios nos EUA foram a zero”, disse Forster. “Mas quando modelamos tudo, parecia que este é um negócio que pode prosperar com base na China e na Europa.”
Os EUA são um “mercado de nicho” para os exportadores chineses de tecnologia limpa, de acordo com uma análise recente dos dados do Comtrade da ONU realizada pelo Centro de Pesquisa em Energia e Ar Limpo.
A análise constatou que, embora 15% das exportações chinesas tenham ido para os EUA, esse número foi de apenas 4% para os setores de energia solar, eólica e veículos elétricos. As economias em desenvolvimento representaram 70% do crescimento das exportações nessas categorias de 2021 a 2024, segundo o relatório.
Enquanto isso, o investimento doméstico da China na transição energética continua a crescer, subindo 20% para US$ 818 bilhões no ano passado, de acordo com a BloombergNEF.
“Temos cada vez mais olhado para empresas focadas em infraestrutura [de baixo carbono] dentro da China, que continua a ser desenvolvida”, disse Ulrik Fugmann, co-chefe do grupo de estratégias ambientais da BNP Paribas Asset Management.
Como em outros setores, está longe de ser claro que as perdas dos exportadores estrangeiros representem o ganho das empresas dos EUA. Entre as concessionárias que buscam expandir em energia renovável —que muitas vezes é a fonte mais barata disponível— o aumento no custo das baterias teria um efeito “devastador” no investimento em armazenamento estacionário, dada a produção doméstica limitada dos EUA, disse Antoine Vagneur-Jones, analista da BloombergNEF. Outro golpe viria dos aumentos no custo das células solares, outra área onde os EUA têm relativamente pouca produção própria.
O maior fabricante de painéis solares dos EUA, a First Solar, teve um aumento no preço das ações com o anúncio inicial de tarifas de Trump na semana passada, embora tenham perdido esses ganhos desde então. Outras empresas de energia limpa dos EUA que deveriam se beneficiar da exclusão de concorrentes chineses também sofreram quedas nos preços das ações.
A Nextracker, por exemplo, que fabrica “rastreadores” que mantêm os painéis solares inclinados em direção ao sol, caiu 12 % desde 1º de abril, contra uma queda de 6,5% para o índice S&P 500. A Fluence Energy, que fabrica sistemas de armazenamento de baterias, caiu 20%.
Um grande problema para muitos fabricantes de tecnologia limpa dos EUA é o aumento do custo dos componentes atingidos por tarifas da China, que domina muitas partes da cadeia de suprimentos de energia verde.
A queda no preço das ações também refletem preocupações de que, em meio à turbulência econômica e incerteza decorrente das políticas erráticas de Trump, as concessionárias de serviços públicos e outras empresas podem adiar decisões de investimento em projetos de energia limpa.
“A incerteza é inimiga do investimento de longo prazo, como o investimento em infraestrutura energética”, disse Tarek Soliman, diretor executivo da Calvert Research and Management.
À medida que o impacto mais amplo dos aumentos tarifários entra em vigor, muitos economistas esperam que os EUA entrem em recessão neste ano. Alguns investidores já estão olhando para o estímulo fiscal e monetário que pode ser necessário para tirar a economia do buraco.
Com sua sensibilidade incomum aos custos de empréstimos, o setor de energia renovável seria um beneficiário principal de cortes nas taxas, observou Cooper.