O Comando da Aeronáutica, vinculado ao Ministério da Defesa, enviou um pedido à Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) para cobrar informações sobre a redistribuição dos slots da Voepass no aeroporto de Congonhas, em São Paulo.
A Voepass teve seus voos suspensos pela agência no dia 11 de março devido ao descumprimento de exigências operacionais. Desde então, os 20 slots diários –horários de pouso e decolagem– que a companhia aérea possui em Congonhas estão sem uso, deixando vago espaços no segundo aeroporto mais movimentado do país.
Conforme informações obtidas pela Folha, o Centro de Gerenciamento da Navegação Aérea (CGNA), vinculado ao Comando da Aeronáutica, acionou diretamente a diretoria da Anac para questionar sobre o vácuo operacional.
“Atualmente o total de slots definidos para o referido aeroporto não está sendo utilizado em sua capacidade plena, apresentando-se no sistema uma subutilização da capacidade total do aeroporto”, afirmou o Centro de Gerenciamento da Navegação Aérea, em comunicado enviado ao diretor-presidente da Anac, Roberto José Silveira Honorato.
Na prática, o Comando da Aeronáutica pede que os slots da Voepass sejam disponibilizados para voos gerais, que são feitos por táxi aéreo ou jatos executivos, em vez de redistribuídos para outras companhias de voos regulares, como TAM, Gol e Azul.
Segundo a Aeronáutica, as regras atuais de uso de Congonhas estabelecem que, caso surja um slot da aviação regular (de qualquer companhia aérea) que não apresente um plano de voo até quatro horas antes do horário previsto para ele, esse slot pode ser oferecido “para todos os usuários que tiverem interesse, de forma imparcial”.
“Essa medida visa ao aproveitamento da máxima capacidade disponível do aeroporto e espaço aéreo”, afirmou o centro. Ocorre que essas disponibilidades de slots da Voepass, segundo o órgão da Aeronáutica, não têm sido repassadas ao sistema administrado pelo CGNA, desde o início da suspensão da empresa, um mês atrás.
“Dessa forma, os slots da Passaredo (Voepass) não estão sendo incluídos no Sigma (Sistema Integrado de Gestão de Movimentos Aéreos) e não estão sendo oportunizados para utilização por nenhum outro usuário, diferente do que ocorre para outras companhias aéreas no caso de não utilização”, afirma o Comando da Aeronáutica.
A Folha questionou a Anac sobre o assunto. Por meio de nota, a agência informou que “os referidos slots não podem ser redistribuídos para operadores aéreos da aviação geral”, como pede o Centro de Gerenciamento da Navegação Aérea, mas somente para as empresas que atuam com voos regulares.
Questionada sobre a decisão de manter os slots sem uso, a Anac declarou que sua diretoria colegiada decidiu pela não retomada imediata dos slots atribuídos à Voepass porque a empresa “ainda dispõe de tempo hábil” para cumprir o índice mínimo de uso de Congonhas, caso recupere seu Certificado de Operador Aéreo (COA), que segue suspenso.
Como mostrou a Folha, essa decisão está relacionada a uma resolução da agência. As normas da Anac estabelecem que cada companhia aérea tem que manter pelo menos 80% de voos regulares em cada temporada (inverno ou verão) para manter o controle de seus slots e garantir a continuidade das operações.
No dia 30 de março, teve início a chamada “temporada de verão” da aviação, que se estende até o dia 25 de outubro. Na prática, isso significa que, caso a Voepass não volte a ter voos regulares até o dia 11 de maio –data em que já terá passado 20% da temporada–, ficará impossível cumprir a meta mínima de 80% dentro do período.
Se isso se confirmar, a Anac retomará os slots por falta de uso e fará a distribuição para outras companhias. “A área técnica da agência segue monitorando a performance dos slots da Voepass. Caso seja identificada a impossibilidade do cumprimento do índice de regularidade mínimo, a Anac realizará a retomada desses slots e providenciará sua imediata redistribuição para empresas aéreas regulares”, afirmou o órgão regulador.
Todos os dias, Congonhas tem autorização para operar com um volume de até 44 slots por hora, essas faixas horárias de pouso e decolagem. Desses 44 slots, 40 são distribuídos entre as companhias aéreas comerciais, que fazem os voos regulares, enquanto os quatro restantes são repassados a voos gerais, normalmente feitos por jatos particulares e táxis aéreos.
É essa a segunda fatia de usuários que a Aeronáutica pretende atender, ao acionar os slots da Voepass que hoje estão sem uso.
Autoridades do setor aéreo veem como mínima a possibilidade de a Voepass Linhas Aéreas voltar a se firmar como uma companhia com operações regulares diante das dificuldades enfrentadas pela empresa.
Dois integrantes da cúpula do governo afirmaram à Folha, sob reserva, que não acreditam que a empresa vai conseguir vencer os problemas operacionais, financeiros e, principalmente, de confiança dos passageiros, a despeito dos esforços da companhia para retomar os voos paralisados por determinação da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil).
Após o acidente aéreo ocorrido no dia 9 de agosto do ano passado, em Vinhedo (SP), foi implantada uma operação assistida de fiscalização da Anac nas instalações da companhia. Funcionários da agência acompanharam os trabalhos de operação e manutenção da empresa para verificar as condições necessárias à garantia da segurança.
A queda do voo 2283, que fazia a rota entre Cascavel (PR) e Guarulhos (SP), provocou a morte de 62 pessoas. O desastre foi o mais letal do país desde 2007, quando um acidente com o voo 3504 da TAM nos arredores do aeroporto de Congonhas deixou 199 mortos.